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Duas jornalistas caem no mundo unindo duas paixões: viajar e ajudar o próximo. Aqui, elas relatam as alegrias, os perrengues e os aprendizados dessa experiência.

Desafios de ser uma mulher sozinha no (verão do) Oriente Médio

Porque precisamos falar sobre isso.

Por Camila Anauate
Atualização:

Porque ser mulher, estrangeira e estar sozinha no Oriente Médio é coisa séria.

Porque me sinto oprimida todos os dias.

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Não é a primeira vez que visito o Oriente Médio, mas é a primeira vez que passo mais tempo aqui. Tempo suficiente para viver experiências de abuso e discriminação.

E isso vai muito além de cultura, crença ou religião. Tem a ver com quem eu sou.

Faz quase 40 graus todos os dias, com sensação térmica de muito mais, mas a recomendação é sair coberta - de preferência ombros, colo, bunda, tornozelos e pés - para não chamar atenção dos homens. Nem das mulheres. Para ir ao mercado, ao restaurante ou até mesmo praticar esporte. Para minha própria segurança.

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Coloquei na mala saias longas, calças largas, mangas compridas, lenços. Com altas temperaturas, é sofrido acostumar-se. Ainda ouso não passar tanto calor.

Até o dia em que visito Citadel, este lugar lindo da foto, o ponto mais alto de Amã, com ruínas romanas. Sozinha. Não cobria tudo, mas longe de estar descoberta. Não importa. Um egípcio se aproximou, fingiu querer me ajudar, me segurou forte pelo braço e passou a mão na minha bunda. Por reflexo imediato, soquei a cara dele, gritei e corri. Chorei. Nunca me senti tão violada, incrédula, impotente.

Citadel. Foto: Camila Anauate

Sinto nas ruas os olhares intimidadores, incriminadores. Me sinto mal.

Vejo lugares que separam mulheres e homens.

Vejo ainda forte o papel bela-recatada-e-do-lar.

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Agora mesmo, enquanto escrevo esse texto, soube que, a partir de segunda-feira, só posso frequentar o campo de futebol no dia em que as meninas treinarem. O campo é minha fuga diária, minha prática esportiva, meu momento descontração. Fiz amigos ali nas últimas três semanas - meninas e meninos. Não pode, não posso. Não mais. Parece que as próprias mães reclamaram da presença de tantas mulheres estrangeiras ali. Não sei.

Porque estou no lugar deles, é preciso respeitar. Mas aceitar não dá.

Porque lidar com isso é, para mim, a parte mais difícil dessa jornada.

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