Os vinhos de altitude de Cafayete

A 1.750 metros acima do nível do mar, ao se aproximar da cidade, incontáveis placas indicam o caminho para as vinícolas que dão nome à rota que leva à cidade

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Por Mariana Goulart
Atualização:
A tradicional Bodega El Esteco,no coração dos Vales Calchaquies, funciona em um casarão colonial eproduz ao todo nove rótulos Foto: Mariana Goulart/Estadão

Conhecida como Ruta del Vino, a rota 68 liga Salta e Cafayate por uma via sinuosa, que se transforma lindamente pelo caminho. Próximo a Salta, o que se vê é uma paisagem verde, com os cerros cobertos de árvores e intermináveis plantações de tabaco esparramadas aos pés da montanha, que colorem o chão de verde e amarelo. As casinhas coloniais dos povoados que margeiam a estrada transformam o trajeto em uma viagem no tempo. Pouco a pouco, o verde dá lugar ao laranja e mais uma infinidade de tons de vermelho. O clima úmido fica seco. Uma hora depois, a paisagem já é outra.

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A transformação começa ao entrar na Quebrada das Conchas, vale formado no Rio das Conchas. O nome tem sua razão: era comum encontrar conchas por ali, resquício de eras em que aquele solo pertencia ao fundo do mar

As surpresas se sucedem. Como o povoado fantasma de Alemanía, vilarejo que surgiu ao lado da linha do trem e que, durante anos, foi o principal ponto de comércio da região. Quando o trem foi desativado, as pessoas abandonaram o local e o que restou foram as casinhas de adobe. 

Anfiteatro, formação rochosa com paredes de mais de 20 metros de altura, tem excelente acústica Foto: Mariana Goulart

Um pouco mais adiante, quem surpreende é a natureza, com a grandiosa Garganta do Diabo (o encontro das paredes do cerro que formam uma galeria) e o Anfiteatro, formação rochosa com paredes de mais de 20 metros de altura. O nome se deve à excelente acústica – o espaço até já foi usado para apresentações musicais.

Taças a postos Cafayate está a 1.750 metros acima do nível do mar e, ao se aproximar da cidade, é possível entender o porquê do nome da rota: incontáveis placas indicam o caminho para as vinícolas. A cena se repete na região central, onde algumas empresas mantém suas adegas.

Depois de três horas de viagem, fomos direto almoçar no hotel Viñas de Cafayate. Embora ali não funcione uma vinícola, há parreirais por todos os lados. Seu restaurante é aberto ao público e, no menu, há comidas tradicionais e uma carta de vinhos tentadora. 

Visita à vinicolas inclui os parreirais Foto: Mariana Goulart/Estadão

Pablo Kishimoto, um dos proprietários do hotel, nos acompanhou durante o almoço. Aficionado por vinhos, ele nos apresentou alguns dos melhores rótulos produzidos na região. Foi nosso ponto de partida para um dia de muito aprendizado – e alguns bons goles. 

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Embora a Argentina seja conhecida pela qualidade de seus vinhos tintos de Malbec, aqui a Torrontés é o carro-chefe da maioria das vinícolas. A cepa emblemática é oriunda do país e destina-se à produção de um vinho branco bem floral que, apesar de parecer doce no nariz, é seco na boca. 

Para conhecer mais sobre essa uva seguimos para a tradicional Bodega El Estecono coração dos Vales Calchaquies, fundada em 1892. Instalada em um casarão colonial, produz ao todo nove rótulos, de diferentes uvas.

Soledad Palma, nossa guia, explicou as diferenças na forma como as uvas são plantadas. E ressaltou a importância da altitude, que dá aos frutos um sabor mais intenso. A plantação da vinícola se espalha em frente ao casarão e avança em direção ao cerro. Nas maiores altitudes estão as uvas que serão utilizadas para os vinhos mais exclusivos.

Depois de cerca de 20 minutos caminhando entre os parreirais, fomos conhecer o processo de produção antes de chegar à melhor parte: a degustação. Provamos três taças, dois tintos e um branco (Torrontés, claro), enquanto Soledad nos orientava a perceber as diferenças de sabores e aromas de cada um. O passeio custa 150 pesos (R$ 23), e é realizado de hora em hora. 

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História

Para se aprofundar mais no tema, visite o Museu de La Vid y el Vino, a duas quadras da praça central de Cafayate. Ali, o visitante vai conhecer a história do vinho e descobrir por que a terra, a altitude, o clima e o relevo da região são tão importantes para a produção de rótulos de alta qualidade. Entrada: 60 pesos (R$ 9,50).

Cafayate há muito deixou de ser apenas a casa dos trabalhadores das bodegas. Hoje, o centrinho de casas de adobe e clima bucólico abriga dezenas de hotéis, bares, restaurantes, lojas de souvenirs e até – pasme – uma fábrica de cervejas artesanais em pleno reduto vitivinícola. 

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Ao redor da praça central, e nas ruas próximas, o clima é agitado. O comércio funciona até as 21 horas, e o vai e vem de turistas é grande. Para quem acha que o vinho se restringe as taças, as gelaterias que ficam ao redor da praça central provam que não é bem assim. Dentre os inúmeros sabores no cardápio (incluindo doce de leite, claro), dois se destacavam: gelato de vinhos Malbec e Torrontés. Peça sua casquinha e aproveite a sombra das árvores para degustar, sem pressa.

Não perca em Salta:

Aproveite o fim da tarde em Salta para subir ao Cerro San Bernardo de teleférico Foto: Mariana Goulart/Estadão

1- Plaza 9 de Julho A praça é o ponto de fundação de Salta - ao redor dela estão a igreja, o palácio do governo e um calçadão com bares, restaurantes e cafés.

2- Museu Güemes Inaugurado ano passado, fica em um casarão que já foi Tesouraria Real de Salta, no século 18, e casa do General Martín Miguel de Güemes (1785-1821), importante figura na luta pela independência. As dez salas contam a vida de Güemes de forma interativa. Dica: acesse a rede do museu pelo Wi-Fi e acompanhe as explicações de cada sala pelo celular. Rua Espanha, 730.

3 - Museu de Arqueologia da Alta Montanha (Maam) Próximo ao Güemes, o Maam guarda um importante acervo inca. Destaque para as múmias Niños de Llullaillaco. Em 1999, foram encontrados no vulcão Llullaillaco, a 6.700 metros de altitude, os corpos de três crianças. Elas foram ofertadas aos deuses como forma de agradecimento, um ritual comum na cultura inca. Por causa do frio, os corpos permaneceram praticamente intactos por quase 600 anos. Para evitar que se deteriorem, a múmia exposta é trocada a cada sete meses.

4 - Cerro San Bernardo Aproveite o fim da tarde em Salta para subir ao Cerro San Bernardo de teleférico. O bondinho parte do Parque San Martín e leva ao topo do morro em apenas 10 minutos. Também é possível subir a pé (são dois quilômetros e uma escadaria com 1.021 degraus) ou de carro. Custa 200 pesos (R$ 32), ida e volta.

Sinta-se em meio aos parreirais no vídeo 360º a seguir. A experiência será melhor aproveitada pelo seu aparelho celular. 

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