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Quando os amigos pedem favores

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Por Redação
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Em uma carta simples e direta, mr. Miles presenteia a redação com a pergunta da semana: Mr. Miles: o que fazer quando um amigo pede que se transporte algo para o exterior ou do exterior para o Brasil? Aposto que muitos leitores já passaram por "saias justas" desse tipo… Joana Marques Seibel, por e-mail"Well, my dear Joana, eis um caso em que não há regras, senão as do common sense. Usar esse princípio, darling, pode ser muito simples. Um modo fácil de verificar se a demanda é justa é tentar inverter o seu papel, como viajante, com o do solicitante. Se alguém, for instance, lhe pedir a gentileza de transportar um pneu de Aero-Willys 1968 para um velho amigo colecionador de carros em Madri, será justo que você, politely, se recuse a fazê-lo. O requerente não se ofenderá, I presume. E, se o fizer, será justo que você reveja suas amizades.Há outros casos que o bom senso rejeita. Por exemplo: pequenas entregas que lhe custarão horas de locomoção. O querido amigo sabe que você vai a Nova York e pede, com os olhos rasos d'água, que certa relíquia familiar seja entregue em algum subúrbio perto de Connecticut - o que o obrigará a alugar um automóvel, perder-se em anéis rodoviários e, of course, correr o risco de levar uma polpuda multa de trânsito. Sem contar com o dia perdido, no qual você poderia estar flanando pelo Village ou por Little Italy… Bad idea, isn't it? Fuja também das encomendas de artigos raros. A priminha pede-lhe um indispensável livro de fitoterapia de autoria de um mestre oriental, que está esgotado desde 1971, 'mas que, em Nova York, com certeza se acha fácil'. Pronto: sua sonhada viagem pela Big Apple torna-se uma fastidiosa peregrinação por sebos, onde há Paulo Coelho em farsi e até exemplares da Bíblia em aramaico - mas nada, of course, do livro encomendado. Decline, as well, do transporte de produtos que tenham propensão a causar embaraços com autoridades. Coisas aparentemente inofensivas como armas, entorpecentes ou explosivos podem causar-lhe constrangimento. Do you know what I mean? Ou mesmo um simples salame, um queijo minas fresco ou uma muda de samambaia. Os agentes de controle sanitário da maior parte dos países podem fazê-la pagar caro pelo favorzinho.Quem pede favores como esses não tem bom senso, don't you agree? Então não se acanhe e diga não. Be careful, anyway, com as chantagens emocionais. Não é fácil, por exemplo, dizer não a quem pede remédios para parentes adoentados. O problema é que, sem uma receita internacional válida, você não vai conseguir comprá-los - e, for sure, será chamada de desumana quando retornar com as mãos vazias. Life is not fair, my dear. Já aspirinas e outros remédios de uso liberado (as pessoas, unfortunately, sempre acham que o que se produz no exterior é mais forte e efetivo), você pode trazer à vontade. Assim como cola para dentaduras, adesivos nasais que prometem silenciar os que roncam e outras quinquilharias que já vi serem encomendadas em inúmeras ocasiões.Vou lhe contar, em confidência, uma situação constrangedora em que me meti, a propósito, alguns anos atrás. Eram os anos da Cortina de Ferro e eu estava de partida para a então inexistente Letônia, quando uma conhecida, chamada Vinga, apareceu-me com uma pequena caixa de metal nas mãos. 'Oh, my God, Miles', pediu-me ela entre lágrimas, 'o último desejo de meu pai era que suas cinzas fossem jogadas no Rio Daugava. Aqui estão as cinzas de sua cremação', continuou, apontando para a caixinha. 'I beg you, my friend, faça essa homenagem a ele', insistiu Vinga. Jamais conheci Bóris (esse era o nome do pai), mas também jamais pude resistir a uma mulher em lágrimas. No dia seguinte, portanto, desembarquei em Riga com Bóris no bolso de meu sobretudo, porque julguei profundamente desrespeitoso (e arriscado) colocá-lo na mala.Unfortunately, my dear Joana, Bóris foi encontrado por um inescrupuloso agente alfandegário soviético, desses que ocupavam as capitais do leste europeu na ocasião. O burocrata, exaltado, imediatamente expropriou as cinzas. De nada adiantaram minhas explicações: o pai de Vinga, I presume, foi parar na prateleira de um almoxarifado. Nunca contei nada a ela e, of course, tenho algumas crises de remorso, embora, at least, o fato é que as cinzas de Boris repousam na Letônia. Aprendi, contudo, a não transportar desconhecidos no bolso. Como se vê, é só uma questão de common sense." É O HOMEM MAIS VIAJADO DO MUNDO.ELE ESTEVE EM 183 PAÍSES E 16 TERRITÓRIOS ULTRAMARINOS

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