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Sobre zika e outras doenças: viajante, não entre em pânico

 

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Por Adriana Moreira
Atualização:

Em Kasane, o primeiro safári por Botsuana (Bruna Toni/Estadão) Foto: Estadão

Por Bruna Toni

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"A malária para nós é como a dengue para vocês", comparou Thandi Tsheko, funcionária da Embaixada de Botsuana no Brasil, que nasceu lá, vive aqui há alguns anos e acompanhava meu grupo pelo país do sul do continente africano no começo de 2015. Era uma conversa despretensiosa durante uma viagem de carro, na volta de um safári. Thandi comparava a relação da população de seu país com a malária à dos brasileiros com a dengue que nos assola todo verão.

Transmitida pelo mosquito Anopheles, há anos a malária é um problemão de saúde pública em Bostuana. Risco que me fez ter um cuidado especial antes de embarcar para lá. Nada exagerado, mas uma pesquisa para entender melhor a doença, sua transmissão e, claro, prevenção contra o tal mosquito.

Foi assim que descobri que deveria priorizar as roupas claras na mala (mas confesso que usei preto, má ideia para quem precisa se esquivar do Anopheles e também do nosso velho conhecido Aedes aegypti). Não levei repelente: eu tinha uma dúvida mal resolvida sobre a real eficácia do produto vendido no Brasil contra mosquitos nascidos lá. Achei melhor deixar para comprar o repelente já em solo africano.

Foi um erro. Dos aeroportos pelos quais passei em Botsuana, o mais moderno não passava de uma casinha simpática de cômodo único, com um guichê de madeira onde as passagens são preenchidas à mão (tem algo mais maravilhoso para apaixonados por coisas antigas?), uma lanchonete honesta e um trio de cadeiras no centro. Nem sinal de loja.

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Mas encontramos repelentes à disposição em todos os quartos nos camps e lodges onde nos hospedamos durante a temporada em Botsuana. E ainda mosquiteiros em torno das camas - diferentemente do Aedes, o Anopheles tem hábitos mais noturnos - e, na falta de ar condicionado, ventilador de teto.

A conversa do começo deste post tem me voltado à lembrança com frequência desde que a dúvida sobre viajar ou não às áreas de proliferação do Aedes virou preocupação frequente dos turistas - não só pela dengue, mas também pelo atual surto de zika vírus. No caso da malária, com informação prévia na bagagem e repelente na pele e sobre as roupas, nunca me assustei de fato, mesmo nos momentos em que estive mais próxima das áreas com maior número de casos.

Além disso, Botsuana me proporcionou tantas experiências singulares que nem de longe essa é a maior lembrança que tenho de lá - são essas aqui: Botsuana, detox da Alma.

A comparação feita por Thandi Tsheko entre malária e dengue teve a ver com a forma como encaramos socialmente as situações. Sem desconsiderar a gravidade das doenças, é válido lembrar que moradores do local atingido terão um olhar diferente sobre elas. Para estrangeiros - mesmo que estrangeiro signifique apenas de outra região geográfica do mesmo país - a situação pode parecer mais assustadora do que é de fato.

O bombardeio de notícias e boatos, de recomendações médicas e jornalísticas nem sempre significam qualidade de informação e acaba se tornando um motor para o medo. O medo resulta em muitas coisas, inclusive preconceito. Poucos de nós nos colocamos no lugar do outro, como reforça sempre Mia Couto (leia entrevista do escritor ao colega Daniel Ribeiro).

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O médico infectologista Jessé Alves Reis, coordenador do Ambulatório de Saúde do Viajante do Hospital das Clínicas, recomenda "avaliar a real necessidade de viajar". Nesse momento de surto de zika vírus, concordo com o alerta. O médico também atestou a eficácia dos repelentes - por 1h30 a 2 horas - algo de que eu duvidava um pouco, confesso. Mas acho também que é preciso pensar sobre o tipo de viajantes que somos, colocar-se no lugar do outro, apurar o olhar para o mundo dele. É preciso não entrar em pânico.

Ah, e no repelente, acredite.

Ricardo Freire: O Nordeste e o zika. É preciso cancelar a viagem?

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