Doutor Ashour chega cedo, acompanha o culto devocional com os outros voluntários, pede por um dia de muito trabalho, paciência e sabedoria. Depois arregaça as mangas, coloca as luvas e trata os dentes de refugiados, missionários, voluntários e de quem mais pedir ajuda.
Ele atende até dez pacientes por dia, três vezes na semana, na igreja do vilarejo de Fuheis, onde funciona a sede da organização MAIS - e também a clínica médico-dentária. Com o salário que recebe da MAIS, consegue bancar o aluguel e a comida da casa onde mora com a família. Ele chegou à Jordânia há um ano meio, depois que o irmão foi morto no Iraque e a família, obrigada a fugir.
A vida era organizada no Iraque - formou-se dentista, tinha trabalho, casa, lazer - até a chegada do Estado Islâmico. Hoje, aos 31 anos, depois de tudo o que passou, e ainda passa, Ashour apenas agradece a oportunidade de ainda poder exercer sua profissão, seu dom, ajudar seu povo.
"Esse trabalho me dá muitos benefícios: o principal é servir às pessoas, não só meus conterrâneos do Iraque, mas sírios, jordanianos, egípcios e até brasileiros", sorri um sorriso tímido.
Ele e a família aguardam visto para migrar para a Austrália. Não se sabe quando.
Quem ajuda Ashour na tarefa de tratar os dentes de Fuheis é a jovem Mira, 22 anos, recém-chegada à Jordânia, ex-estudante, sonhadora. Quer ser dentista também. Quem sabe quando conseguir o visto norte-americano - a família dela já está na fila.
Como Ashour e Mira, conheci muitos outros profissionais, refugiados, que encontraram na MAIS uma oportunidade de trabalho, de pagar as contas e, acima de tudo, ajudar outros refugiados. E recuperar a dignidade.
Em comum, a espera de um visto para qualquer lugar que lhes garanta um futuro.