Cerveja amarga para harmonizar

No país conhecido pelos ótimos vinhos, é a bebida à base de cevada que ganha espaço na alta gastronomia

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Por Evan Rail
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Durante a degustação dos pratos da culinária regional piemontesa, o sommelier trouxe uma bebida especial para acompanhar o ravióli recheado com abóbora e aspargos. "Acho que isso vai bem porque combina com a doçura da abóbora", disse ele, servindo não um copo de vinho, mas de uma cerveja amarga. A qual, explicou, havia sido fermentada como os vinhos e envelhecida por quatro anos na garrafa. Parece estranho harmonizar cerveja gelada com a cozinha italiana, especialmente em Piemonte, região cheia de amor pelo vinho. Mas toda a refeição naquela noite foi servida com as bebidas produzidas no local. O nome do sommelier era Teo Musso, um mestre cervejeiro com status próximo ao de uma estrela do rock no cenário da gastronomia italiana. Em sua pequena cervejaria, Le Baladin, Musso ajudou a construir a ponte entre a cerveja artesanal e o jantar sofisticado. Assim, garantiu a presença de cervejas finas no supermercado mais badalado de Turim, o Eataly, e fundou seu próprio restaurante-hotel, inspirado na bebida, a Casa Baladin. As cervejas artesanais ganharam espaço na Itália. E as cervejarias especializadas invadiram os restaurantes de alta gastronomia, transformando o país em um destino atraente para apaixonados por cerveja. Decidi conferir de perto - e degustar - as novidades durante uma viagem de cinco dias com minha mulher. O foco do roteiro esteve em duas regiões italianas que têm reputação crescente no mundo da cerveja: Piemonte, ao longo da fronteira com a França, e Lombardia, ali ao lado, beirando a Suíça. A maioria dos turistas provavelmente iria começar por Milão, capital da Lombardia e coração da cena cervejeira na região. Mas fomos direto à pequena cidade de Lurago Marinone. No primeiro pub, Birrificio Italiano, as lendárias cervejas trouxeram turistas de todas as partes do mundo aos Alpes. Celebramos a chegada com uma dupla de pilsens. O mestre cervejeiro do local, Agostino Arioli, costuma viajar à Alemanha para escolher o lúpulo. Enquanto bebericávamos as lagers, soltando comentários vibrantes sobre o amargor do líquido, uma banda de jazz subiu ao singelo palco. Começaram a tocar no momento em que chegaram os aperitivos: um prato de torradas incrustadas com sementes de papoula e cobertas com queijo tipo toma e uma pegajosa geléia, acompanhadas de um copo de Scires, cerveja forte como vinho e com o gosto das cerejas locais. Os pratos principais vieram rapidamente: uma corpulenta carne de porco escaldada na chapa e um prato de filetes de porco grelhados, ambos marinados no malte da Bibock, que se revelou um excelente acompanhamento. Os mesmos sabores apareceram na sobremesa: uma panacota cuja doçura foi levemente apagada com uma dose da Bibock, que combinou perfeitamente com o pó de chocolate no topo do pudim. Milão tem reputação crescente entre os amantes da cerveja graças, em parte, àquela que dizem ser a primeira cervejaria da cidade, a Birrificio Lambrate, e a seu mestre cervejeiro, Fabio Brocca. A stout escurecida da Lambrate é o oposto das douradas e gasosas lagers que dominaram a produção industrial de cerveja na Itália. A seleção das cervejas só fica ofuscada durante a happy hour: mais de 30 diferentes pratos e bandejas oferecem petiscos incomuns, como saladas de erva-doce, favas, cogumelos marinados, abobrinhas, pizzas e saladas de massa cozida. Ainda em Milão, outra parada essencial é no A Tutta Birra, que reúne diversas cervejas italianas artesanais. Elas quase transbordam de uma sala com centenas de garrafas e copos. Espiando de perto, pode-se perceber o que é atraente nelas: diferente de muitas importações, a maior parte dessas cervejas evidenciava o olhar italiano para um elegante design, dos tipos usados no rótulo ao formato da garrafa. SERVIÇO COMO CHEGAR O trecho de ida e volta entre São Paulo e Milão custa R$ 2.764,15 na TAM (www.tam.com.br) A maior parte das cervejarias italianas pode ser facilmente alcançada com um carro alugado no Aeroporto de Malpensa, a 48 quilômetros do centro de Milão. Confira, abaixo, alguns dos melhores estabelecimentos localizados nessa rota: Casa Baladin (Piazza V. Luglio 15, Piozzo; www.casabaladin.it). Diárias para casal por 120 (R$ 362). Jantar com cervejas a ? 60 (R$ 181) por pessoa. Birrificio Lambrate (V. Adelchi 5, Milão; www.birrificiolambrate.com). Começou sua produção em 1996, fazendo apenas 150 litros por dia. Agora, fabrica mais de 2 mil litros. O bar anexo tem happy hour entre 18 e 20 horas. O copo pequeno de cerveja custa 3,50 (R$ 10) e o grande, ? 4,20 (R$ 13). A Tutta Birra (Via Lazzaro Palazzi 15, Milão; www.atuttabirra.com). Reúne muitas das cervejas italianas artesanais, além de marcas de outras regiões do mundo. Birrificio Italiano (Via Castello 51, Lurago Marinone; www.birrificio.it). Fica a cerca de meia hora a partir de Milão e serve as melhores lagers fora de Bohemia. Há bebidas por preços entre ? 8 e ? 10 (R$ 24 e R$ 30). Birrificio Grado Plato (Viale Fasano 36/bis, Chieri; www.gradoplato.it). Não saia de lá sem provar algum dos pratos de escargot disponíveis no cardápio.

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