Com vento no rosto, uma descida pela Estrada Real

Todo cuidado é pouco: chão de terra e buracos garantem doses de adrenalina na pedalada em grupo pelo deslumbrante trecho entre Cunha e Paraty

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Por Felipe Mortara e CUNHA
Atualização:

O verde e o relevo exuberantes da Mata Atlântica do Parque Nacional da Serra da Bocaina tentam desviar a atenção. A descida vai de 1.400 metros até o nível do mar. No rosto e no peito, o vento frio e a umidade batem sem dó. A bicicleta ganha velocidade. Uma delícia. Mas o estado é de alerta o tempo todo, já que um buraco ou pedra podem facilmente transformar a aventura em um grande susto - ou acidente sério. Assim é a maior parte dos 30 quilômetros do trajeto entre a interiorana Cunha, em São Paulo, e a litorânea Paraty, no Estado do Rio. Trata-se do trecho final da Estrada Real, por onde outrora as pedras preciosas extraídas de Minas Gerais - especialmente Diamantina e Ouro Preto - chegavam ao porto de Paraty. Se há muito tempo não passam pedras e metais valiosos por ali, o mesmo não se pode dizer dos tesouros guardados neste bem preservado trecho de mata. Conhecida como estrada Cunha-Paraty, a RJ-165 só tem condição de tráfego para veículos 4x4 - quase vazia, para alegria dos não motorizados. Uma boa pedida é fazer o tour em grupo, com carro de apoio por perto. Escolhi me juntar a um passeio do grupo paulistano Sampa Bikers, que custa R$ 450. Éramos cerca de 30 ciclistas. Mountain bike em boas condições, com freios revisados e pneus calibrados, é indispensável. Fôlego e preparo físico, também. Eis a primeira má notícia: os 6 quilômetros iniciais são de ascensão íngreme até a divisa dos Estados de São Paulo e do Rio. O lado bom - afinal, não custa nada ser otimista - é que o trecho é asfaltado. O percurso leva cerca de uma hora, com parada para banho em uma pequena cachoeira. No fim, há recompensa: quando acaba o périplo ladeira acima é servido um farto piquenique com frutas, cereais e refrigerante. Só não vale exagerar, já que a melhor parte - e mais perigosa - está para começar. Tensão. A mata se fecha e o asfalto termina. Ao grupo, as recomendações do guia Paulo de Tarso, fundador do Sampa Bikers, são claras: "Cuidado, todo ano alguém vai parar no hospital durante esse passeio". Os ciclistas apenas se entreolham. Uma placa indica o início do Parque Nacional da Serra da Bocaina. Das paisagens, não espere nada menos que um dos trechos mais bem preservados da Mata Atlântica. O outono costuma oferecer dias abertos, pouco risco de chuva e boa luz para fotografar. Os mais familiarizados descem na frente, as mãos sempre nos freios, com cautela, já que há o perigo de capotar. O clima geral é de muita descontração - as mulheres formam um grupo ainda mais animado, que vai descendo e se divertindo com cuidado. A prestadora de serviços Sylvia Sanchez, de 51 anos, se distraiu em plena reta e foi ao chão, sem gravidade. "Meu pé ficou preso na pedaleira e, na hora que tirei, já não deu tempo. É normal dar uma caidinha sem machucar, até dou risada", explica. Em casos mais graves, o jipe de apoio é acionado para socorrer. Reta final. Após 20 quilômetros e 2h30 em estrada de terra, um asfalto liso marca a saída do parque nacional. Mais um pouco e uma igrejinha anuncia o bairro da Penha, já em Paraty. Ali, uma estratégica parada para pastel - com cerveja, por que não? - no bar da Fátima e da Marlene. Desculpa um pouco mais convincente é a emocionante cachoeira do Tobogã, que moradores destemidos descem em pé, no perigoso "surfe na pedra". Mas descer sentado já é garantia de boa diversão e refresco na água gelada. E as ruas de paralelepípedo do centro de Paraty estão a apenas 5 quilômetros dali.

O básico de Paraty

A Flip vem aí

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Celebrando seu 10º aniversário, a Festa Literária Internacional de Paraty é o próximo grande evento na cidade. De 4 a 8 de julho, homenageará o poeta Carlos Drummond de Andrade. Mais: flip.org.br

O que ver

Passeio de barco pelas ilhas; tour até cachoeiras; visita a alambiques que fabricam a famosa cachaça local; caminhada a pé pelo centro histórico, com paradas nas igrejas e ateliês. Mais: paraty.com.br

Quarto real

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Pousada do Príncipe (pousadadoprincipe.com.br) tem nome literal: pertence a D. João de Orleans e Bragança, bisneto da princesa Isabel. Os quartos não são de palácio, mas compensam. Diária a R$ 190, para casal.

Sabor

Duas coisas são imperdíveis no restaurante Arpoador: a moqueca de lula recheada com siri e a música ao vivo. Desvantagem: não aceita cartão com a desculpa de que "a rede está sem sinal". Rua da Matriz, 7. (24) 3371-4004.

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