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É carnaval. Você tem filho

Bloquinhos infantis são chatos, infelizmente. E, para blocos adultos, nem sempre eles têm paciência

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Por Monica Nobrega
Atualização:
Como é o carnaval com crianças já não tão pequenas? Foto: Gabriela Biló/Estadão

Eu juro que não voltei grávida do meu primeiro carnaval em Olinda/Recife, apesar do meu filho ter nascido no fim daquele mesmo ano.

Voltei foi numa paixão arrebatadora pela folia pernambucana. Ainda no voo Recife-São Paulo, eu já fazia planos para voltar no próximo ano. E no outro, no outro, em todos, até o fim da vida.

Gravidez detectada, prometi a mim mesma que seriam no máximo dois carnavais longe das mágicas ladeiras, dos bonecões, da energia dos Quatro Cantos. Afinal, quantas crianças eu tinha visto fantasiadas de super-herói no domingo do Enquanto Isso na Sala de Justiça? Com certeza o meu bebê logo seria um daqueles fofos mini Batman. Ia dar tudo certo.

Pois bem. Até dá para continuar na folia. Principalmente com bebê. Bebês são portáteis, topam qualquer parada se estiverem limpos, alimentados e no colo, se divertem com uma pedrinha no chão, dormem no carrinho quando bate o cansaço.

As opções para famílias também têm aumentado muito nos últimos anos, embora eu me sinta no dever jornalístico de contar que acho bloquinhos infantis chatíssimos e meio constrangedores. Tocam horas de músicas sobre alegria, diversão e animaizinhos da floresta cantadas por adultos de vozes, expressões e gestos tolos.

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(Como exceção, indico – para o ano que vem – o grupo de palhaços Orquestra Modesta, com músicas ótimas e que passam bem longe das tolices convencionais para crianças).

Mas bebês crescem. As multidões do carnaval de rua não são o lugar mais legal do mundo para crianças. Ainda que seu filho tope umas horas andando debaixo do sol, gigantes como o pernambucano Galo da Madrugada, o carioca Cordão da Bola Preta ou o paulistano Tarado Ni Você são um esforço grande demais. 

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Meu filho, que era exatamente aquele bebê ali de cima que topava tudo, foi descobrindo que não gosta tanto assim do carnaval. Esse ano, na tentativa de comprar a boa vontade dele para o meu bloquinho do coração no pré-carnaval paulistano, ofereci a fantasia do seu anime preferido. Um desses desenhos que considero violentos demais e que ele, ainda bem, tem a rebeldia de continuar gostando.

Fomos à Liberdade, às lojinhas frequentadas pela meninada que faz cosplay. Bandana, R$ 39,90. Uma espadinha e uma estrela ninja, R$ 26. Almoçar um lámen, que ele adora, ali mesmo no bairro, era parte do suborno; lá se foram mais R$ 115. Tudo somado, já dava uma passagem para o carnaval do Rio de Janeiro.

No Bloco do Ó, no domingo de manhã, a boa vontade dele durou o tempo que durou a lata de espuma em spray, essa desgraça que todo mundo detesta, mas que mães e pais compram para suas crianças na esperança de uns 15 minutos livres para rebolar até o chão.

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Nas quatro horas de cortejo, carreguei várias vezes nos ombros um menino de 30 quilos que volta e meia botava a mão na testa e dizia que ia desmaiar de calor (não ia, conheço a peça). Encontrei uma velha amiga com suas duas meninas, tão entediadas quanto o meu próprio filho. Cedemos e autorizamos um pacote de Doritos de um mercadinho fuleiro, depois da milésima reclamação de fome no meio do deserto hipster infernal da Vila Madalena, onde atualmente só existem restaurantes pretensiosos e quase nenhuma padaria para vender um pão de queijo simples.

Por fim, almoçamos num desses restaurantes cheios de pose e comida cara, o que custou mais R$ 225. Dava uma passagem para Recife, para onde, aliás, ainda não voltei.

Não me entenda mal. Ter filho é ótimo. Viajar com ele, melhor ainda. E no meio disso tem o carnaval.

Neste finalzinho de carnaval, desejo bons bloquinhos a quem é da folia; bom descanso a quem é de retiro; e boa pipoca para quem é de maratona de série. E a todos, por via das dúvidas: camisinha. E consentimento.

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