Império dos sentidos

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Por Paulo Saldaña e DOURO
Atualização:

Assim como a natureza é fundamental para o bom vinho, chego à certeza de que a gula e a contemplação são essências de Portugal. A impressão que fica desse país é de que uma daquelas lindas paisagens - de vale coberto de vinhas, cortado pelo rio, ou de castelos murados, como em contos de fadas - fazem parte do cardápio. É como se fosse possível pedir ao garçom uma(s) garrafa(s) de vinho, um queijo de cabra antes do bacalhau e também aquele visual, a especialidade da casa. E tudo chega à mesa ao mesmo tempo.Portugal é um país com laços incontestes com o Brasil. Uma espécie de visita à antessala da nossa história, com sotaque. Claro que o resto do velho continente tem seus encantos, mas nosso irmão de língua guarda um menu de sabores, aromas e lugares que impressiona.Por falar em língua, é tentador não sair por aqui citando as armas e os barões assinalados de Camões ou o mar salgado, com lágrimas de Portugal, de Pessoa. Tentarei me conter, mas há um chavão do qual não dá para fugir: é preciso fazer o caminho inverso dos navegadores e descobrir Portugal. Porque apesar de pequeno no tamanho, o país é muito diverso em identidade.Estamos em uma nação com 92 mil quilômetros quadrados, tamanho semelhante ao de Santa Catarina. Do Minho, no norte mais rural, ao Algarve, de lindas praias, no sul, a viagem pode te jogar em cidades pitorescas ou nas mais efervescentes Porto e Lisboa - as duas maiores do país. No caminho, relevos diversos, com paisagens que escondem monastérios, castelos e igrejas seculares. Por isso, apesar do tamanho diminuto, não dá para conhecer o tesouro todo de uma vez. Há de se fazer escolhas.Como beber é preciso, vamos nos organizar em torno de regiões onde a mesa e, principalmente, os copos são protagonistas: Douro e Alentejo, duas afamadas regiões de produção de vinho do país, donas de belos cenários do enoturismo mundial. Além, é claro, de Lisboa - porque é impossível deixar a capital de fora em uma viagem à antiga metrópole do Império.Mais do que sentar em mesas e visitar palácios, igrejas e castelos, as cidades portuguesas convidam a prazeres simples: se perder a pé por ruas e vielas, tomar café despreocupado, bater papo com os moradores. Atualmente, o povo tem sentido a crise que atinge a Europa, como se vê na conversa nas padarias e bares. Para o turista, no entanto, isso até pode passar despercebido. Os preços tiveram leve alta, mas ainda dá para comer, em duas pessoas, o bacalhau mais incrível da sua vida por menos de € 18 (cerca de R$ 47).Portugal tem 11 milhões de habitantes, ou seja: uma São Paulo inteira cabe ali dentro. Interessados no Brasil, os portugueses são simpáticos e bem humorados - mas é necessário entendê-los. Muitas vezes parecem impacientes e uma discussão trivial entre o garçom e o barman pode parecer uma tragédia. Da mesma forma, recusar o pãozinho do couvert pode provocar uma cara feia do outro lado do balcão. Um casal de brasileiros contou que levou uma bronca de um português inconformado ao tentar recusar o vinho no jantar. Mas, pudera: recusar uma coisa dessas é mesmo quase uma ofensa.

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