RIO DE JANEIRO - Pneus, garrafas, estrado de cama e embalagens diversas grudadas umas nas outras formam manchas em geral amarronzadas sobre a superfície da Baía de Guanabara. Trazidas pela maré, movem-se lentamente de uma borda a outra, sinal de que não têm a menor preocupação com o tempo que lhes resta por ali - nem com os olhares desgostosos de quem as mira a partir da revitalizada Praça Mauá, no centro do Rio de Janeiro.
Desde que o Museu do Amanhã foi aberto, em 17 de dezembro de 2015, os olhares para a zona portuária do Rio se tornaram mais relevantes - e não menos críticos. Aos questionamentos sobre a polêmica operação Porto Maravilha, responsável pela revitalização da área abandonada da cidade, mas também pela remoção de famílias inteiras da região contra a vontade das mesmas, somaram-se questionamentos sobre a instalação de um polo cultural focado em pautas de sustentabilidade justamente em um lugar onde o que se vê é o mais claro desequilíbrio ambiental.LEIA MAIS: Museu do Amanhã prepara programação para os Jogos
Em fevereiro, imagens do lixo no entorno do Museu do Amanhã circularam pela internet e reascenderam a discussão sobre o cenário contrastante (às vésperas da Olimpíada). "Incomoda quando a gente vê uma foto tirada da praça com lixo do lado e o Museu do Amanhã ao fundo, né? As pessoas ligam perguntando 'como assim, o que isso tem a ver com o museu?'. Não tem a ver e tem. Não tem porque não foi provocado pelo museu, o museu foi colocado aqui. Mas tem a ver porque ele está no nosso cenário, é nossa casa, é nossa praia, e a gente vai ter de se envolver de alguma forma com a solução desse problema", afirma o diretor do Museu do Amanhã, Ricardo Piquet.
Segundo ele, a questão da poluição da Baía sempre esteve em pauta, assim como a discussão sobre o papel do museu na conscientização dos visitantes. A ideia inicial era montar um aquário com água limpa e com água da Guanabara para mostrar o tamanho do impacto. A proposta acabou se transformando na futura instalação de um observatório patrocinado pela iniciativa privada, que terá como objetivo contribuir com a educação da população, sem a pretensão de despoluir o local - cujo papel e financiamento Ricardo Piquet afirma não serem obrigação do museu, mas do governo.
"Todos os esforços de todos os governos se mostraram ineficientes até hoje. Nem a Olimpíada foi suficiente para uma ação eficaz. O nosso papel será o de acompanhar e cobrar medidas de mudança desse cenário antes do amanhã. Se o amanhã é daqui 30, 40 anos, não justifica estar dessa forma", afirma o diretor do museu.LEIA MAIS: Os melhores bairros para se hospedar na Olimpíada
Além de cobrar ações governamentais, há a clara preocupação em mudar "a cabeça" e as ações das pessoas por dois motivos, sobretudo. O primeiro deles é a constatação pela própria casa de que o público visitante abraça moradores dos 17 municípios banhados pela Baía de Guanabara. O segundo é que, para além da Baía, muitas vezes a área do próprio Museu do Amanhã acaba virando lata de lixo. É o que ocorre muitas vezes com os espelhos d'água, limpos durante a nossa visita, mas que também já foram clicados mais escuros do que deveriam. Quanto a isso, Ricardo Piquet reconhece: "Aí sim, é nosso quintal". Segundo ele, a coleta regular já está sendo feita para, futuramente, se tornar um monumento ao lixo. "Estamos pensando agora em como devolver para o cidadão: 'olha, isso aqui foi jogado por pessoas que vieram nos visitar e não tiveram o mínimo cuidado com o amanhã'", conta.LEIA MAIS: Saiba por que o Rio é o melhor destino em 2016