A pergunta que não quer calar é se sou um embusteiro sem remorsos ou um fenômeno da longevidade. Costumo dizer que não sou tão jovem a ponto de gostar de festas rave e nem tão velho a ponto de aceitar que perdi o encanto por esse formidável, surpreendente, traiçoeiro planeta em que vivemos – e que, esquecidas as fronteiras, os interesses econômicos, as falácias nacionalistas e as ideologias utópicas, é, sempre, com toda a certeza, o quintal de nossa casa.
Tive de viver mais de um século – e, talvez, tenha a dádiva de ir ainda mais longe –, comandando minha cruzada individual em favor de que as pessoas não se apequenem e conheçam, como já dizia my dear friend João Cabral de Melo Neto, a parte que lhes cabe nesse latifúndio. E que grande parte é essa, porque inclui as montanhas, os oceanos, as culturas, os idiomas, os sabores e os aromas, as geleiras e os desertos, tudo nosso, tudo feito para que nossos horizontes sejam sempre infinitos e nossos sonhos não tenham grilhões.
E, se vivo tanto, é porque preciso de tempo para lhes contar, necessito do passado para impulsionar o futuro, relativizar as certezas e garantir que nada do que hoje é sinônimo de virtude não vai voltar a ser vício e fraqueza e vice-versa.
É com esse tempo – tão pouco, afinal – que fui brindado para poder avaliar que o conhecimento e o progresso não são, unfortunately, sinônimos de que evoluímos e, por isso, somos mais felizes. E tampouco o contrário é verdadeiro.
A ironia disso tudo, dear Charles, é que você está certo em duvidar de minha implausível longevidade. Mas se ela, de fato, for apenas uma fantasia, seria uma pena se passássemos a não aceitar que elas existem – e delas precisamos.MR. MILES É O HOMEM MAIS VIAJADO DO MUNDO. ELE ESTEVE EM 183 PAÍSES E16 TERRITÓRIOS ULTRAMARINOS.