Parque no Vale do Ribeira proporciona imersão na Mata Atlântica

Legado das Águas oferece trilhas e banhos de rio e cachoeira

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Por Bruna Toni
Atualização:
Córrego Dezembro margeia a trilha de mesmo nome. Foto: Bruna Toni/Estadão

MIRACATU - “Dizem que o céu dessas árvores centenárias é tão desconhecido quanto o fundo do mar”, disse João Dias enquanto olhávamos embasbacados para o topo de uma figueira gigante de 200 anos. João é um dos coordenadores da reserva privada Legado das Águas, uma área de 31 mil hectares no Vale do Ribeira, a 3 horas de São Paulo. Ali estão abrigados nada menos do que 1,5% dos 9% que restaram de Mata Atlântica no Estado, incluindo a majestosa figueira.

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Meu encontro com ela e com outras tantas plantas foi na quarta-feira última, durante um bate-volta até a reserva a partir da capital. Adquirido pelo Grupo Votorantim para a implantação de usinas hidrelétricas entre as décadas de 1920 e 1950, o território chega a um total de 50 mil hectares – maior que Curitiba –, dos quais 31 fazem parte do que hoje compreende o Legado das Águas. Contudo, foi apenas em 2012 que o grupo firmou uma parceria com o governo estadual para oficializar o espaço como uma área de conservação, destinada tanto à pesquisa e educação científicas quanto à geração de recursos financeiros para se manter ativa e preservada.

A renda chega por meio da reprodução de plantas à venda a visitantes e paisagistas e, mais recentemente, por meio do ecoturismo, que vem sendo estruturado aos poucos e, segundo seus coordenadores, tem levado em conta o desenvolvimento dos três municípios atravessados pela reserva: Miracatu, Juquiá e Tapiraí. Eles integram uma área paulista de baixo Índice de Desenvolvimento Humano (IDH). 

Tanto o coordenador João Dias quanto o monitor ambiental José Alves Batista, o Zeca, como o conhecemos, fazem parte da proposta da empresa de contratar mão de obra local e utilizar a expertise de quem conhece bem a floresta não só pela vivência, mas também pelos estudos. Para isso, atraíram ainda pesquisadores universitários como Mauro Rebelo, cujo projeto, batizado Floresta Digital, pretende criar um banco digital de espécies da Mata Atlântica encontradas ali para estudos científicos diversos.

Entre as opções de passeios disponíveis estão trilhas, travessias, observação de aves, canoagem e percursos de bicicleta. Há os de um dia, como o que fizemos, mas também é possível pernoitar no alojamento para até 28 pessoas ou acampar. Todos necessitam de agendamento prévio e, a princípio, ocorrem em datas determinadas pela reserva – quem quiser ir num dia específico deve entrar em contato. 

No site legadodasaguas.com.br é possível conferir os dias das atividades e comprar ingressos. Quanto às refeições, não se preocupe: além da figueira e de toda aquela imensidão verde que resiste ao tempo e às ações depredatórias, os sabores do refeitório local completaram um dia tão relaxante que os problemas do dia a dia não tiveram lugar. 

Como ir ao Legado das Águas: são 130 km de São Paulo a Miracatu pela BR-116. O ponto de encontro de passeios agendados é no Graal Japonês (km 348). 

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Opções de passeios

Partimos cedinho da capital e conseguimos aproveitar três passeios do Legado das Águas, com tempo suficiente para driblar os longos minutos de chuva (algo comum no vale de outubro a março). Leve na mochila capa de chuva, protetor solar e repelente; no corpo, roupas confortáveis, traje de banho e tênis antiderrapante. Com 280 espécies de aves catalogadas, trata-se de um ótimo programa para observadores de pássaros, que podem pedir por trilhas personalizadas.

Anta vista no Legado das Águas. Foto: Luciano Candisani

Banho na cachoeira O Legado Experience é a experiência de um dia da reserva (R$ 140 por pessoa). O roteiro começa no viveiro de mudas nativas, criado há pouco mais de 2 anos em parceria com a Escola de Agricultura da USP. Nele são reproduzidas 108 espécies de plantas, destinadas ao reflorestamento e ao comércio – não resisti e trouxe para casa um vaso de quaresmeira (R$ 15), cuja etiqueta com QR Code permite acessar uma página que indica suas principais características.

O barato ali é acompanhar de perto todo o processo vital das plantas, desde o momento em que elas nascem “numa espécie de maternidade”, como diz Silas, responsável pelo local, até aquele em que elas se tornam adultas e independentes, vistosas em seus próprios vasos. 

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Em seguida, é possível partir para a floresta na Trilha do Cambuci, com 3 km, ida e volta. Nós fizemos, porém, a trilha Dezembro, também com 3 km. Foram cerca de 2 horas entre subidas, descidas e banho de cachoeira em meio à Mata Atlântica. Por causa das chuvas constantes, o chão é sempre barrento – daí a importância de tênis adequados – e só um pequeno trecho possui corrimãos para auxiliar a caminhada. Ainda assim, não é uma trilha difícil, e todo o grupo, de diferentes perfis, fez o trajeto com tranquilidade. Houve só uma derrapada de leve: a minha, que caí sentada (e na risada). 

O ápice é o banho na Cachoeira Dezembro. Mas gostei também de relembrar a diferença entre plantas briófitas, pteridófitas e angiospermas quando me deparei com exemplares de cada uma – e fui alertada por um biólogo, claro.

Figueira gigante A Trilha da Figueira vem logo depois do almoço – dê preferência para comer do lado de fora do refeitório para curtir o colorido dos pássaros que ficam por ali à procura de alimento. Curtinha e com acesso por uma rampa de maneira, é acessível para qualquer pessoa. É ali que você vai conhecer a figueira centenária e também o Jardim Sensorial, com espécies selecionadas para provocar seus sentidos, como a estévia, cuja folha, comestível, tem gostinho de adoçante. O dia termina com um passeio de barco pelo Rio Juquiá e com lanche da tarde: no nosso caso, pão de queijo fresquinho e café. 

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Serpente encontrada entre os exemplares da fauna do Legado das Águas. Foto: Luciano Candisani

Travessia e bike A travessia Dezembro-Cantagalo pode ser feita de duas formas. A primeira, chamada volta menor, tem 12 km, leva de 7 a 8 horas e é de nível intermediário. A segunda, com 23 quilômetros, é considerada intensa e leva dois dias para ser concluída, com pernoite acampando na mata. Os preços vão de R$ 220 a R$ 461 por pessoa em grupos de no mínimo 10. 

Para os ciclo aventureiros, são seis percursos, passando pela mata e suas comunidades locais, com distâncias entre 8,4 e 36,4 km e nível de dificuldade intermediário. O próximo passeio, de 3h30, está marcado para 30 de outubro – leve a bike. Desde  R$ 169 por pessoa.

Outra opção é o caiaque. O roteiro oferecido permite percorrer 9 km (4 de canoagem e 5 de lancha) da Represa do Porto Raso e é destinado até para quem nunca remou na vida – mas é preciso esforço. Inclui parada para banho na represa e numa cachoeira e almoço na comunidade Ribeirão da Anta. 

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