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Quem troca brilhante?

Uma viagem pelos antigos álbuns de figurinhas - e a história que eles contam

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Por Bruna Toni
Atualização:
Cafu durante apresentação do álbum da Copa do Mundo 2018 Foto: Everton Oliverira/Estadão

Era março quando a viagem para a Rússia teve seu martelo batido. Euforia, expectativa, um tantinho de medo e até a banalizada #gratidão tomaram conta de mim. Cinco minutos depois, porém, uma angústia me invadiu. Ir bem agora que faltam apenas 27? Quem está me devendo, vai sumir no mapa. Para quem fiquei devendo, meu sumiço será sinônimo de boicote nas trocas dos anos seguintes. E se acontecer o pior? E se, quando retornar, todos já tiverem com seus álbuns completos, me forçando a uma atitude drástica e triste: pedir (numa afirmada humilhação) as faltantes à editora?

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Colecionadores de figurinhas do mundo todo entenderão o drama. É que eu gosto de futebol. Mais extasiante do que ver a rede balançar, porém, é abrir um novo pacotinho e vibrar com aquela figurinha tão aguardada – porque é craque; porque é seu ídolo; porque é histórico; porque, enfim, é a última que faltava para preencher a página. Talvez se equipare a isso um 7 a 1 sobre a Alemanha um dia. Talvez.

Veja também: A Rússia Logo Ali: as curiosidades do país-sede da Copa 

Fato é que corri para diminuir o número de figurinhas faltantes antes de embarcar. Veja: já estava difícil encontrar as brilhantes, tem todo aquele sentimento de conspiração das fábricas para que você compre mais pacotinhos... Embarquei com uma anotação peculiar na listinha de lugares a visitar em Moscou e São Petersburgo: bancas de jornal. Não importava que o álbum fosse idêntico ao vendido no Brasil e no resto do mundo. Ele era russo. No ano da Copa na Rússia. 

Um fim de semana antes da viagem, gastei algumas horas folheando álbuns de futebol antigos, todos devidamente conservados e arquivados pelo meu namorado. Com seus 30 e poucos anos, a coleção começava no ano de 1990, quando o Mundial foi sediado pela Itália – e a campeã foi a Alemanha pela terceira vez, se igualando ao Brasil no número de títulos. Perseguição?

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Outras Copas

Para além de lembranças pessoais – como ele só tinha 6 anos, quem completava os resultados dos jogos no álbum era sua mãe –, há muita história ali. Em 1990, por exemplo, a Alemanha campeã ainda era a Alemanha Ocidental (a Oriental não se classificou para o torneio). Nesse ano, haviam ainda os times da União Soviética (eliminada na primeira fase), da Iugoslávia e da Checoslováquia. 

Antes mesmo dos álbuns, foram as figurinhas que vieram primeiro. Na Europa, em 1870 e, no Brasil, no início do século 20. Com temas variados, eram brindes de maços de cigarros, pacotes de sabonetes e, mais tarde, de embalagens de balas e chicletes – se você não for um millennial, irá se lembrar disso. A primeira coleção de figurinhas nacional foi produzida pela empresa de tabaco Estrela de Nazareth em 1906 e chamava-se 60 Bandeirinhas: cada uma correspondia a um país diferente. Apesar do espaço de informações reduzido, eram uma maneira de apresentar outros lugares, símbolos e culturas.

O álbum mesmo só surgiu aqui em 1934 – e foi em 1950, junto com a primeira Copa sediada no Brasil, que tivemos o primeiro álbum oficial sobre futebol. E para provar que a paixão por colecionar figurinhas vai além dos resultados, o livro foi comercializado só depois do Mundial chegar ao fim – com o Brasil perdendo o título para o Uruguai em pleno Maracanã. Nossa “pior derrota” até então. Bom, é também a prova de que álbuns e figurinhas correm menos risco de nos decepcionar.

Entre álbuns antigos do mundo inteiro encontrei Estados que não existem mais e que jamais poderão ser visitados; achei jogadores que fizeram história e que hoje são referências mundiais de seus lugares de origem (dizer que sou brasileira na gringa significou muitas vezes dizer que sou da terra do Pelé); achei símbolos que dizem muito sobre os valores exaltados por suas nações; achei cidades e estádios para serem visitados nas minhas próximas viagens; aprendi a falar nomes de países em muitas línguas. E percebi que o tempo pode ser cruel com alguns jogadores – ou melhorá-los muito. 

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Cadê o álbum que estava aqui?

Não encontrei o álbum da Copa na Rússia. Lançado no país há duas semanas, ainda não haviam alcançado as prateleiras de São Petersburgo – até Google Tradutor usei, mas estou convencida que este vício de álbuns é menos viral por lá. Para não voltar sem nada, me satisfiz com o álbum do campeonato russo. Uma boa distração enquanto não encontro a figurinha que falta para, enfim, completar o álbum da Copa do Mundo de 2018: a da Arábia Saudita. Sim, deste país que abrirá o Mundial ao lado da Rússia e que, em 1990, nem sequer tinha uma página dedicada a ele no álbum. Digam o que quiserem, mas, até a presente data, é o país mais importante do Mundial para mim. E é brilhante.

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