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Turismo com apoio da comunidade: conheça iniciativas no Brasil

Empresas criam programas focados em oferecer a povoados fonte de renda alternativa por meio do turismo

Por Ana Beatriz Assam
Atualização:
Turismo de base comunitária ajuda a economia das comunidades visitadas, sem deixar de valorizar seus costumes e valores culturais Foto: Paula Arantes/Garupa

Muito mais do que conhecer lugares novos, as pessoas buscam cada vez mais um turismo que priorize a experiência e que permita se conectar ao lugar visitado, de forma consciente. Com esse sentimento, o chamado Turismo de Base Comunitária (TBC) vem ganhando cada vez mais espaço, uma alternativa ao modelo de turismo convencional em que comunidades tradicionais são protagonistas, participando ativamente da organização e gestão dos projetos. 

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Além de estimular o desenvolvimento econômico local dessas comunidades, que muitas vezes contam com poucas alternativas de geração de trabalho e renda, o TBC prioriza a preservação dos seus modos de vida, costumes e valores culturais. “A gente entendeu que o turismo, além de gerador de renda, é importante ferramenta para que essa comunidade se desenvolva, gere autoestima, se organize, tenha voz”, conta a turismóloga Liliane Jacintho, sócia da agência Plana, que tem foco em turismo de experiência.

Para quem visita, Liliane acredita que é uma oportunidade de “virada de chave”, de desmistificar a imagem pré-montada que temos sobre essas comunidades e conhecer um pouco mais da história do país.

“Eu sempre pensava que era uma viagem com muitas privações, mas cheguei lá e vi que é uma viagem altamente qualificada, segura e ao mesmo tempo impactante”, conta o dentista Fábio Bibancos, que conheceu Alter do Chão, Pará, no ano passado com a Vivejar, operadora com foco em turismo de base comunitária. 

O cronograma de atividades é montado com a intenção de que o turista mergulhe no cotidiano dessas comunidades. “Não é um tipo de turismo contemplativo como a gente está acostumado, a pessoa tem que estar predisposta a interagir”, explica Paula Arantes, responsável pela operação dos projetos de TBC da ONG Garupa.

Para ela, as pessoas voltam mais sensíveis aos próprios hábitos de consumo, repensando as relações com natureza. “É uma grande transformação do turismo, as pessoas estão mudando de um turismo passivo para um turismo interativo”. 

Conheça três iniciativas que já fazem turismo de base comunitária no Brasil:

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A Garupa montou dois roteiros: um com perfil mais aventureiro, outro mais cultural Foto: Marcelo Monzillo/Garupa

GARUPA Criada em 2012 como um projeto de financiamento coletivo para ajudar pequenas iniciativas de turismo, a ONG realiza expedições em caráter experimental em terras indígenas, na região de serras entre as cidades de Santa Isabel do Rio Negro e São Gabriel da Cachoeira, no Amazonas

O turismo na região é autorizado pela Fundação Nacional do Índio (Funai) através de uma Instrução Normativa de 2015, que regulamentou as atividades de visitação em Terras Indígenas. Até o momento, já foram realizadas 8 expedições, em um total de 67 viajantes.

São dois roteiros, montados em parceria com as comunidades visitadas: Iwitera (serra), com perfil mais aventureiro, e Maniaka, (mandioca), com perfil mais cultural. Ambos possuem atividades como passeio em canoa, trilhas na mata, banho de rio, participação em festas típicas e oficina de artesanato, tudo gerido pela comunidade. O preparo das refeições também fica a cargo dos moradores. 

Preparo das refeições fica a cargo dos moradores da comunidade Foto: Marcelo Monzillo/Garupa

“A comida é sensacional. Provei várias frutas novas, mingau, peixes maravilhosos e fizemos várias trilhas com vistas incríveis dentro da floresta”, conta a estudante de direito e antropologia Luisa Suriani, que viajou com a Garupa em 2017. “Mas acho que os pontos altos foram as pessoas, as trocas, as conversas. Voltei muito mexida e comecei a estudar antropologia porque percebi que poderia me ajudar a entender e talvez a traduzir as coisas que eu vi lá”.

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O pernoite é realizado em alojamentos coletivos, onde os turistas dormem em redes. Para este ano, a Garupa também oferece o roteiro a bordo do barco Untamed Angling, que serve de meio de transporte e hospedagem, visitando e realizando atividades em todas as comunidades durante o dia. São oito suítes premium (seis com janelas panorâmicas e duas com varanda), spa com jacuzzi, salas de estar e jantar.

Do valor arrecadado pela ONG, 16% fica para as comunidades e 5% é destinado à Associação das Comunidades Indígenas e Ribeirinhas.

Indiretamente, o turismo na região também auxilia na fiscalização e na preservação da área, grande preocupação das comunidades. “O que a gente percebeu que funciona muito bem com essa experiência é que o fato de ter turistas na área ajuda na fiscalização, porque tem gente circulando, os barcos estão indo de um lado para o outro”, explica Paula. 

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Destinos: Atualmente, o destino ativo é o Serras Guerreiras de Tapuruquara, na região de serras entre as cidades de Santa Isabel do Rio Negro e São Gabriel da Cachoeira, no Amazonas. Valores: A partir de R$ 6.810. Todos os pacotes incluem transporte a partir de Manaus, hospedagem e alimentação. Duração: 8 a 10 diasSite: www.serrasdetapuruquara.org

Atividades incluem conversas, oficina de artesanato, roda de jongo e ciranda Foto: Plana/Divulgação

PLANA  Em seus dois anos de atividades, a agência já realizou nove vivências, com mais de 50 pessoas, no Quilombo da Fazenda, em Ubatuba, que faz parte do Parque Estadual da Serra do Mar. Neste ano, começou a operar um novo destino: o Quilombo Ivaporunduva, localizado a 55 quilômetros do município de Eldorado, na região do Vale do Ribeira, São Paulo. A agência planeja lançar mais dois destinos ainda este ano: Chapada Diamantina e Jalapão

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Segundo a turismóloga Liliane Jacintho, sócia da agência, os destinos escolhidos para as vivências são lugares que já possuem uma atividade turística, mas que não inserem as comunidades locais de forma eficiente. “A ideia de criar a Plana foi de tanto observar um movimento do turismo muito mais exploratório do que participativo”, conta. “A gente tinha muita vontade de fazer alguma coisa que fosse significativa para quem recebe o turista, quem mora no lugar.”

A gestora financeira Gisele Rocha já participou de três viagens da Plana ao Quilombo da Fazenda. “Foi nessa vivência que eu descobri quantos quilombos existem no Brasil, como essas pessoas vivem, isso despertou muitas coisas que passavam batido”, diz. 

Ela ficou hospedada na casa de Luciano Assunção, que nasceu no quilombo e é monitor ambiental do Parque Estadual da Serra do Mar há 17 anos, guiando os passeios durante as vivências. 

O passeio pelo quilombo é conduzido por um guia que é monitor ambiental Foto: Plana/Divulgação

“Um destaque é a trilha, o Luciano conduz muito bem, a gente faz um tour pelo quilombo e ele explica tudo, as árvores, a casa de farinha, como funciona, como trocavam os alimentos, é um momento muito especial”, conta Gisele. Além da trilha, os visitantes ainda participam de roda de conversa, oficina de artesanato, roda de jongo e ciranda. 

Segundo Luciano, o Quilombo da Fazenda já recebia turistas de forma aleatória, mas se fortaleceu através da parceria com a Plana. “Os benefícios para os moradores são muitos”, afirma. “Além do fortalecimento do nosso território, faz com que mais pessoas conheçam a comunidade, seus modos de vida e suas lutas.” 

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A programação das viagens e os preços cobrados são estabelecidos em conjunto com os moradores, que também são responsáveis por coordenar as atividades. “No final, na hora que a vivência está acontecendo, a Plana não aparece, quem aparece são eles, a gente só foi intermediário”, explica Liliane. 

Do valor pago pelos turistas, 70% é destinado à comunidade, sendo dividido entre aqueles que trabalham durante a vivência, providenciando alimentos ou guiando trilhas, por exemplo. 

Destinos: Quilombo da Fazenda (em Ubatuba), Quilombo Ivaporunduva (a 55 quilômetros do município de Eldorado, na região do Vale do Ribeira, São Paulo) e outras localidades.Duração: normalmente um final de semana, às vezes também em feriados prolongados.Valores: entre R$ 300 e R$ 600 (preços variam conforme a localidade e as atividades), incluindo hospedagem e alimentação.Informações: 11 9-5156-5571 e 11 9-9316-4947; facebook.com/planaturismodeexperiencia; instagram.com/plana.turismo

No roteiro da Vivejar no Pará, os clientes ficam hospedados em um barco, que vai parando nas comunidades ribeirinhas Foto: Ruy Tone/Vivejar

VIVEJAR Com dois anos e meio de atuação, realiza vivências em sete lugares, como Alter do Chão, em Santarém, Pará e no Vale do Jequitinhonha, Minas Gerais, o destino mais antigo da operadora, que nasceu como um braço da empresa social Raízes do Desenvolvimento Sustentável. 

A hospedagem depende do destino da viagem, assim como as atividades realizadas. Em Alter do Chão, por exemplo, os turistas ficam hospedados em um barco, que vai parando nas comunidades ribeirinhas, onde são feitas trilhas, visitas aos projetos sociais da região, rodas de conversa e oficinas de artesanato. 

Expedições da Vivejar no Vale do Jequitinhonha ajudam na divulgação das cerâmicas que são tradição do local Foto: André Dib/Vivejar

Já no Vale do Jequitinhonha, os visitantes se hospedam na casa de moradores, como a ceramista Deuzani Santos, que vive na comunidade rural Coqueiro Campo. Ela conta que o turismo aumentou a renda das famílias da região e ajudou na divulgação das cerâmicas, tradição do local, além de fazer circular o dinheiro. “A comunidade cresce com o turismo”, diz.

Durante o passeio pela região, os viajantes participam de oficina de cerâmica, conhecem o barreiro de onde as artesãs tiram sua matéria-prima, participam de oficina de biscoito e visitam a loja de artesanato de Campo Alegre, outra comunidade do local. As programações são montadas em parceria com os moradores de cada lugar, de forma que não atrapalhe o modo de vida deles, interferindo o mínimo possível.

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As comunidades ficam responsáveis por oferecer oficinas, atividades, alimentação e hospedagem e são remuneradas por todos esses serviços, ficando com 30 a 40% do valor do pacote pago pelos turistas. “O que é muito diferente do turismo convencional é que o turismo de base comunitária se baseia nos princípios do comércio justo”, explica Marianne Costa, fundadora da Vivejar.

Segundo ela, são duas formas de geração de renda para a comunidade: o pagamento direto dos serviços turísticos contratados pela operadora e o indireto dos turistas que acabam comprando artesanato, itens de culinária e outros produtos.

Passeio visita oficinas de artesanato e projetos sociais do entorno de Alter do Chão Foto: Marianne Costa/Vivejar

O impacto econômico local também é um incentivo para os turistas interessados em realizar uma vivência de turismo de base comunitária. “Tinha vontade de conhecer a região e o fato de estar viajando e o dinheiro que eu estou gastando, impactar socialmente aquele local, me interessou muito”, explica o dentista Fábio Bibancos, que conheceu Alter do Chão no ano passado. “Você estimular esses povos a continuarem vivendo ali e terem dignidade de vida ali, isso é proteção da floresta. Essa talvez foi a coisa que mais me comoveu”.

Destinos: Vale do Jequitinhonha, Minas Gerais; Morro da Babilônia, no Rio de Janeiro; Ilha de Cotijuba, em Belém, Pará; Alter do Chão, em Santarém, Pará; Grajaú e Bororé, em São Paulo capital; Mamirauá e Rio Negro, no Amazonas.Duração: Roteiros pré-montados de 1 a 6 dias. Também é possível personalizar o roteiro de acordo com os interesses do turista.Valores: o roteiro Belém Ribeirinha, de 6 dias, com saída em 15 de novembro, parte de R$ 3.350 por pessoa.Site: www.vivejar.com.br