Roubadas e perrengues são coisas a que todos os viajantes estão sujeitos. Ainda mais os de quatro patas. Mas o administrador de empresas Gustavo Vivacqua, de 40 anos, e a psicóloga Ana Machado, de 32, não estão nem aí. Sempre quiseram ganhar o mundo. Por terra. Sem frescuras. E com a fiel companhia do labrador Tapa.
Adaptaram um 4X4 para funcionar também como casa. Afinal, eles sabiam que seria complicado arranjar um lugar para dormir. Não para eles, claro, mas para o cachorro. “Tivemos de correr atrás de uma série de documentos para o Tapa poder viajar, baita burocracia, não podíamos correr o risco de deixá-lo ao relento”, diz Vivacqua.
A ideia era simples: o carro adaptado, que ganhou o apelido de Farofamóvel, facilitaria os deslocamentos e diminuiria os custos da empreitada. Deu certo. “A gente achava que poderia ter trabalho com o carro na viagem. Que nada! Não tivemos nenhum pneu furado”, conta.
Os três, juntos, rodaram quase 130 mil quilômetros e visitaram 46 países. Registraram a aventura em fotos e vídeos. Tinham em mente bolar um documentário. “Mas nunca imaginamos que emplacaríamos o projeto em um canal que você pode assistir em qualquer canto do mundo”, empolga-se.
Produzido pela Soul Filmes, sob direção de Rodrigo Schmidt, a aventura está sendo exibida às 20 horas de sexta-feira no TLC, da Discovery, no programa Viagens Maneiras. O primeiro de 15 episódios foi ao ar na semana passada.
Ok, agora o Viagens Maneiras virou série de TV, mas a ideia original vem dos tempos em que o companheiro de jornadas era Haxi, misto de labrador com dobermann, que rodou o Brasil com o casal. Vivacqua não tira partido disso, mas seu site, o viagensmaneiras.com, foi o precursor na internet brasileira nos relatos de viagem com cachorro. “Foi ao ar em 1998, nos tempos da ‘internet-atari’”, brinca.
Haxi inspirou o site e acompanhou o casal por dez anos, mas nunca conheceu outro país. “Depois que Haxi se foi, pintou o Tapa e, como já conhecíamos tudo no Brasil, resolvemos rodar o mundo com ele.” E assim eles partiram do Rio em julho de 2009 rumo a Foz do Iguaçu. De lá, atravessaram a fronteira para voltar para casa só em agosto de 2011.
Houve episódios de amor à primeira latida, quando Tapa arranjou uma namorada no Peru, e momentos de agonia, quando o “labradoido”, como Vivacqua gosta de chamá-lo, desapareceu por horas perto da fronteira do Equador com a Colômbia.
Mas o bicho pegou mesmo no Oriente Médio. “A gente não fazia ideia de que os muçulmanos não gostam de cachorro”, lembra Vivacqua. “E muito menos se o cão for preto. Para eles, é como se fosse o capeta.”
Não foram poucas as vezes em que tentaram apedrejar Tapa. “Foram três meses de sufoco. Não recomendo a ninguém viajar com cachorro por Arábia Saudita, Jordânia, Síria, Irã... Nem no Marrocos a coisa é amistosa.”
Eles tiveram tantos problemas no Irã que decidiram retornar para a Europa, onde esperaram o inverno acabar para cruzar a Sibéria e chegar ao Japão, via Vladivostok. De lá, o trio despachou o Farofamóvel por mar – só voltariam a vê-lo em Buenos Aires – e seguiu viagem de avião. Novos desafios surgiram. “A grande maioria das aéreas e dos hotéis não aceita animais de médio a grande porte. E o Tapa tem uns 50 quilos.”
Muita negociação e paciência solucionaram os entraves. E renderam algumas lições. “Melhor cuidar dos trâmites burocráticos com meses de antecedência. Cada lugar tem um tipo diferente de exigência”, diz Vivacqua. “Fora isso, tudo depende da boa vontade e do humor dos agentes de imigração. E de muita sorte também.”