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Cavernas do Peruaçu: aventura e beleza no norte de Minas Gerais

Há aproximadamente 170 cavernas no Parque Nacional, cuja visitação começou em 2014. Veja como programar sua visita, sugestões de roteiros e como chegar ao local

Por Monica Nobrega
Atualização:
Turistas no ponto de descanso na Gruta do Janelão. Trilha tem mais de 3 km só no interior da caverna. Foto: Felipe Rau/Estadão

“Na Lapa Bonita a gente fica até encabulado”, seu Getúlio disparou, me livrando da tarefa de achar adjetivos. Nada objetivo, mas de uma precisão notável. É só assim mesmo que dá para se sentir na escuridão e no silêncio completos, quando as lanternas iluminam os espeleotemas que crescem por todos os lados nesta gruta do Parque Nacional Cavernas do Peruaçu: com vergonha de comentar qualquer coisa, porque toda fala parece tolice diante de tanto detalhe e tanta perfeição. 

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O Peruaçu é o vale do rio de mesmo nome, na margem esquerda do Rio São Francisco, do qual é afluente. A área de 56,4 mil hectares virou parque nacional em 1999. A visitação começou em meados de 2014, com a infraestrutura sendo implantada de fato em 2017. Isso falando da visitação turística, claro. Porque a população local conhece de cor as trilhas, os bichos, o clima característico do Polígono das Secas, a fauna, a vegetação que mistura espécies de caatinga, cerrado e Mata Atlântica.

Para conhecer agora os três roteiros básicos para visitar as oito cavernas do parque e organizar sua viagem dia a dia, seguem os links. O roteiro 1 é a trilha da Lapa do Rezar, de perfil histórico. No roteiro 2, veja arte rupestre e admire a paisagem do cânion vista a partir de mirantes. O roteiro 3 traz o cartão-postal do parque: a Gruta do Janelão

Fizemos também uma lista de pousadas e restaurantes para se hospedar e comer perto do parque; clique aqui

A população local agora está mobilizada em torno de um objetivo: tornar o parque um patrimônio da Unesco (leia mais no fim da página). Se tudo sair conforme o planejado, será o primeiro com status de patrimônio misto no Brasil: natural, pelo conjunto de cavernas abrigadas em seu interior – são 140 catalogadas e 170 estimadas em toda a região –, e cultural, por causa das pinturas rupestres que comprovam a presença humana na área há pelos menos 12 mil anos. 

Durante a minha visita, na primeira semana de junho, uma comissão de avaliadores do Iphan (Instituto Nacional do Patrimônio Histórico) também esteve no parque para uma inspeção que é um dos passos decisivos para a candidatura formal a Patrimônio da Unesco. 

“As impressões foram as melhores possíveis. Desconhecia a monumentalidade das formações rochosas e a riqueza das pinturas rupestres existentes no local”, disse ao Estado um dos integrantes da comissão, o diretor do Departamento de Cooperação e Fomento do Iphan, Marcelo Brito. A Gruta do Janelão, cartão-postal do parque, deixou os integrantes da comissão impressionados. 

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Comunidade

Getúlio Bispo da Rocha e eu engatamos a conversa lá do começo acomodados à grande mesa de madeira de Rita de Cássia Lima. Ela é dona da pousada e restaurante Portal do Peruaçu; ele tem uma vida inteira na mineração nestas serras e, aos 72 anos, estuda para ser guia. O almoço na presença de ambos, ao redor da mesa cheia – carne de sol, mandioca, abóbora, feijão tropeiro, feijão em caldo, arroz, batata frita, salada, não existe mesa mineira com pouca comida –, resumia num feliz acaso o que é uma viagem por estas bandas, no norte de Minas Gerais. Dias de imersão na natureza e numa vida rural, calmaria, muita prosa e muita comida. Hospitalidade sem frescura sob comando de gente da terra. 

Getúlio Bispo da Rocha, morador da comunidade Fabião, ex-mineiro e atual aprendiz de guia. Foto: Mônica Nobrega/Estadão

Apesar dos incentivos institucionais diversos que a área vem recebendo – as prefeituras dos municípios de Itacarambi e Januária dão suporte à candidatura a patrimônio; o ICMBio cuida da conservação e da infraestrutura; o Sebrae coloca dinheiro em treinamentos e divulgação –, o tipo de turismo que começa a se desenvolver no Peruaçu é genuinamente de base comunitária. Moradores começam a abrir pousadas domiciliares que são as opções de hospedagem literalmente aos pés do parque, na comunidade Fabião. Cozinham em seus pequenos restaurantes. Guiam passeios. 

Atualmente, são oito as cavernas abertas aos turistas. Um novo roteiro, o circuito Arco do André, está para estrear ainda em agosto, segundo o espeleólogo Leonardo Giunco, conselheiro do Parque Nacional como representante da Sociedade Brasileira de Espeleologia. “É um trajeto bem selvagem pelo cânion, com duração de um dia inteiro e que exige mais preparo físico”, contou. “O caminho margeia o Rio Peruaçu e passa por dentro de duas cavernas que ainda não são abertas ao público, Cascudos e Troncos.” A nova rota já foi homologada pelo ICMBio.

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O número de visitantes no Peruaçu aumentou de 500, em 2014, para 6.890, em 2017. Segundo o chefe do parque, Rafael Pereira Pinto, a previsão é de que o total chegue a 10 mil neste 2018 e que, no futuro, estabilize em 20 mil turistas anuais. O que daria uma média de 50 visitantes a cada dia do ano.

Melhor que sejam assim, poucos. Lotação não combina com o tempo lento e a conexão com a natureza que o Peruaçu propõe. Reserve ao menos três dias inteiros para caminhar em busca dos tesouros da região. Seu Getúlio garante que eles existem, inclusive, no sentido literal: “Antigamente esse lugar tinha dois costumes: fazer feitiçaria para casamento e enterrar dinheiro”. 

Arco do André, caverna que é um dos atrativos do novo roteiro. Foto: Leonardo Giunco

DICAS PARA SE PLANEJAR

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1. Para entender O Parque Nacional Cavernas do Peruaçu tem seus 56,4 mil hectares espalhados por três municípios: Itacarambi, Januária e São João das Missões. A localidade mais próxima do Centro de Visitantes é a comunidade rural Fabião, que fica na divisa entre Januária e Itacarambi, às margens do Rio Peruaçu.

2. Quando ir O ano todo é adequado, mas com características distintas. Maio a outubro é época seca, de paisagem acinzentada; em junho, os dias estavam frescos, facilitando as caminhadas. Chove entre novembro e abril, as florestas ficam verdes e os dias são quentes. Por isso, vale a pena prever passeios mais lentos. 

3. Agendamento As visitas ao Parque Nacional Cavernas do Peruaçu são gratuitas, mas devem ser agendadas por e-mail: cavernas.peruacu@icmbio.gov.br. Também é obrigatório contratar guia – um para até oito pessoas. Custa, em média, R$ 120 a R$ 150. Veja lista de guias credenciados aqui.

4. Transporte É uma viagem que não dá para fazer sem carro. Alugue no aeroporto de Montes Claros.

5. Animais de estimação Não são autorizados a entrar no parque.

6. Repelente Item mais importante da mala. Leve duas opções com princípios ativos distintos. O formato aerossol funciona melhor para passar também sobre a roupa (recomendo muito fazer isso). Atenção: o repelente não pode ser aplicado dentro das cavernas para não prejudicar as formações.

7. Mala O clima é quente: um casaco leve para a noite resolve. Tênis amaciado, boné, calça e camiseta de manga comprida para as trilhas. Protetor solar, lanterna, garrafa para água e mochila para o dia. 

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8. Banho Não há cachoeira ou poço para banho. Como opção, o espeleólogo Leonardo Giunco sugere incluir no roteiro pela região o Refúgio Estadual da Vida Silvestre do Rio Pandeiros, também em Januária. Veja informações e outras sugestões aqui.

COMO CHEGAR

Como chegar: o aeroporto de Montes Claros é ligado ao de Confins, em Belo Horizonte, por três voos diários de ida e volta operados pela Gol (desde R$ 450) e Azul (desde R$ 830); os valores foram pesquisados para o fim de setembro. Depois, são 200 quilômetros pela BR-135 até os bairros rurais Fabião I e II, onde ficam as pousadas domiciliares e a portaria do parque. Também é possível se hospedar em Itacarambi (mais 16 quilômetros). Alugue carro no aeroporto. 

Site: bit.ly/icmbioperuacu.

MOBILIZAÇÃO PELO PATRIMÔNIO

A candidatura do Parque Nacional Cavernas do Peruaçu a patrimônio cultural e natural da Unesco está em fase de construção dos argumentos. Segundo Marcelo Brito, diretor do Departamento de Cooperação e Fomento do Iphan, o próximo passo é a superintendência do órgão em Minas apresentar um parecer sobre as pinturas rupestres para comprovar a singularidade delas – a principal questão é diferenciá-las das que existem na Serra da Capivara, no Piauí, já reconhecidas pela Unesco.

Por causa das pinturas rupestres, o Parque Cavernas do Peruaçu tenta conquistar o título de Patrimônio da Unesco com status duplo, cultural e natural. Foto: Felipe Rau/Estadão

Os envolvidos no processo trabalham com a previsão de apresentação formal da candidatura à Comissão do Patrimônio Mundial em 2021. Uma providência necessária, na avaliação do grupo do Iphan que esteve no Peruaçu em junho, é melhorar as condições da estrada de acesso ao parque. O caminho sem asfalto entre a comunidade Fabião e o Centro de Visitantes é esburacado e, durante as chuvas do último carnaval, chegou a ficar intransitável. 

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A comunidade responsabiliza a automobilística Fiat, que pagou a contratação de empresas para a instalação da infraestrutura do parque graças a um Termo de Ajustamento de Conduta por infrações ambientais firmado com o Ministério Público e o ICMBio. A má qualidade do trabalho feito pelas empresas contratadas pela Fiat e a falta de manutenções posteriores seriam as causas da precariedade da estrada. Em 2015, cerca de 20 entidades integrantes do conselho consultivo do parque assinaram representação ao Ministério Público Federal pedindo apurações. 

Em nota, a Fiat disse que entende que “a manutenção periódica das estradas deve ser realizada pelas autoridades competentes”, mas está “finalizando tratativas para promover melhorias nessas vias”. 

Segundo o relatório Contribuições do Turismo em Unidades de Conservação Federais para a Economia Brasileira feito pelo ICMBio em 2017, com base em dados de 2015, cada R$ 1 investido em áreas de conservação rendeu R$ 7 à sociedade brasileira naquele ano. A secretária de Turismo de Itacarambi, Claudia Seixas, e o secretário de Turismo de Januária, Sidney Olímpio, estimam que a candidatura do Parque Nacional a patrimônio da Unesco custará um total de R$ 1 milhão. 

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